quarta-feira, 28 de maio de 2008

URTICÁRIA PAPULAR

Neste Artigo

- Introdução
- Exame do paciente
- Exames complementares
- Abordagem terapêutica
- Conclusão
- Referências Bibliográficas

A urticária papular é um distúrbio comum e incômodo caracterizado por pápulas crônicas ou recorrentes causadas por uma reação de hipersensibilidade às picadas de mosquitos, moscas, pulgas e outros insetos.

Introdução

O padrão histopatológico da urticária papular consiste em edema subepidérmico leve, extravasamento de eritrócitos, eosinófilos intersticiais e exocitose de linfócitos. Estes achados sugerem um processo imuno-mediado. Em geral, a urticária papular resulta de uma reação de hipersensibilidade às picadas de insetos.

As evidencias morfológicas e imunohistoquímicas sugerem que uma reação de hipersensibilidade tipo I possui um papel central na patogênese da urticária papular. Acredita-se que a reação seja causada por um antígeno de disseminação hematógena transmitido pela picada de um artrópode em um paciente sensível.

A presença de depósitos de imunoglobulina e complemento na pele de alguns pacientes sugere que as lesões possam decorrer de uma vasculite cutânea.

Exame do paciente

A queixa principal é de episódios crônicos ou recorrentes de erupção papular. As lesões podem ocorrer em grupos, quase sempre com prurido intenso, nas áreas expostas às picadas de insetos.

O ato de coçar pode resultar em erosões e ulcerações. Impetigo secundário é comum.

Os principais diagnósticos diferenciais a serem considerados incluem: dermatite herpetiforme, impetigo e pitiríase liquenóide.

Exames complementares

Na maioria dos casos, o diagnóstico pode ser feito com base apenas nos achados ao exame clínico.

Abordagem terapêutica

O tratamento é conservador e sintomático na maioria dos pacientes, com corticosteróides tópicos leves e antihistamínicos sistêmicos. Nos pacientes com infecção associada, o uso de antibióticos é imperativo. O uso de repelentes de insetos pode ser uma medida útil nos casos recorrentes.

As complicações são raras, com prognóstico excelente na maioria dos casos. Nódulos persistentes devem levantar a suspeita de linfoma e a indicação de biópsia.

Conclusão

A urticária papular é um distúrbio comum, especialmente em crianças, caracterizando-se por pápulas recorrentes causadas por reação de hipersensibilidade a picadas de mosquitos, moscas, pulgas e outros insetos. O diagnóstico é essencialmente clínico e o tratamento, sintomático.

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Copyright © 2008 Bibliomed, Inc. 27 de maio de 2008

sábado, 24 de maio de 2008

Abordagem Terapêutica da Hipetrigliceridemia

Abordagem Terapêutica da Hipetrigliceridemia

© Equipe Editorial Bibliomed

Neste Artigo:

- Introdução
- Agentes farmacológicos
- Abordagem do paciente
- Conclusão
- Referências Bibliográficas

Não raramente, pacientes com diagnóstico de dispepsia são referidos ao consultório do Gastroenterologista apresentando, entre outras alterações, aumentos significativos dos níveis séricos de triglicerídios. A Hipertrigliceridemia está associada a um aumento no risco de problemas cardiovasculares e pancreatite aguda. Sua correção, além de reduzir os níveis de LDL e aumentar os níveis de HDL, também diminui a morbiletalidade cardiovascular.

Introdução

O papel da Hipertrigliceridemia como um fator de risco independente para Coronariopatia é controverso, mas muitos estudos observacionais mostram uma associação positiva entre os dois distúrbios.

Muitos pacientes portadores de Hipertrigliceridemia apresentam queixas gastrenterológicas (p.ex.: pancreatite, dispepsia crônica) ou são referidos para acompanhamento com o gastroenterologista como parte de uma abordagem multidisciplinar para obesidade, diabetes ou hipertensão arterial.

Neste cenário, é essencial que o especialista reconheça os recursos terapêuticos à sua disposição e saiba como e quando empregá-los.

Trigliceridemia: níveis

Normal

<>

Aumento Leve

151-199 mg/dL

Aumento Moderado

200-499 mg/dL

Aumento Severo

> 500 mg/dL

Agentes Farmacológicos

Os principais fármacos disponíveis para tratamento farmacológico da Hipertrigliceridemia incluem Estatinas, Fibratos, Niacina e Óleo de peixe.

Estatinas

O objetivo primário do tratamento da Dislipidemia é reduzir os níveis de colesterol LDL. Nos pacientes com hipertrigliceridemia associada, as estatinas são capazes de reduzir os níveis séricos de triglicerídios em 20-40%.

Fibratos

Podem reduzir significativamente os níveis de triglicerídios (40-60%), além de elevar discretamente os níveis de HDL (15-25%). Em pacientes portadores de doenças cardiovasculares, com aumento moderado dos níveis de triglicerídios e baixos níveis de colesterol HDL, os fibratos se mostraram capazes de reduzir o risco de eventos cardiovasculares. O tratamento com fibratos também é capaz de diminuir a progressão da coronariopatia em pacientes com diabetes melito tipo 2.

Vários estudos mostraram que a redução dos níveis de triglicerídios, tanto quanto a redução isolada dos níveis de LDL, é capaz de reduzir os índices de mortalidade por cardiovasculopatias. Por isso, tem havido um grande interesse no emprego de fibratos associados a estatinas em pacientes com dislipidemia mista.

Todavia, a terapia combinada tem causado preocupação do ponto de vista de segurança. Todas as estatinas (especialmente em doses elevadas) aumentam o risco de rabdomiólise. E este risco é aumentado com a associação de fibratos. A saída é utilizar a menor doses possíveis de estatina, monitorizando cuidadosamente possíveis efeitos colaterais relacionados a rabdomiólise (p.ex.: mialgias, urina de cor amarronzada).

Niacina

A Niacina é capaz de reduzir os níveis de triglicerídios em 30-50% e de LDL em 5-25%, além de aumentar os níveis de HDL em 20-30%. Ela não é tão potente quanto os fibratos no tratamento da hipertrigliceridemia, mas é mais eficaz no tangente ao aumento dos níveis de HDL.

Infelizmente, a preocupação quanto ao controle dos níveis glicêmicos pode limitar o emprego da Niacina em pacientes diabéticos. Ainda assim, existe um consenso de que a Niacina pode ser utilizada em pacientes diabéticos de alto risco cardiovascular com hipertrigliceridemia e baixos níveis de HDL.

A Niacina também pode resultar em efeitos colaterais vasomotores e elevação dos níveis séricos de enzimas hepáticas. Estes efeitos adversos podem ser minimizados iniciando-se o tratamento com baixas doses e associando uma tomada de ácido acetil-salicílico 30 minutos antes da Niacina.

Óleo de Peixe

O óleo de peixe contém grandes quantidades dos ácidos graxos essenciais Docosahexaenóico (DHA) e eicosapentaenóico (EPA). Estes ácidos também são conhecidos como ácidos graxos Omega-3. Compostos com 2-4 g de EPA/DHA são capazes de reduzir os níveis de triglicerídios em 30-50%. Além das estatinas, o óleo de peite é o único hipolipemiante capaz de reduzir significativamente a mortalidade global em pacientes com cardiovasculopatia conhecida.

Vale ressaltar que os efeitos benéficos são obtidos com doses diárias de 2-4 gramas de EPA/DHA por dia, e a maioria das formulações disponíveis no mercado possui 300 mg ou menos de EPA/DHA por cápsula.

Hipertrigliceridemia: farmacoterapia

Estatinas

Reduzem os triglicerídios em 20-40% e o colesterol LDL em 18-55%, e aumentam o colesterol HDL em 5-15%. Os principais efeitos adversos incluem miopatia, rabdomiólise e aumento das enzimas hepáticas. Os principais representantes da classe são: Atorvastatina (10-80 mg à noite), Fluvastatina (20-80 mg à noite), Lovastatina (10-80 mg à noite), Pravastatina (10-80 mg à noite), Rosuvastatina (5-20 mg à noite) e Sinvastatina (5-80 mg à noite).

Fibratos

Reduzem os triglicerídios em 40-60%, e aumentam o LDL em 5-30% e o HDL em 15-25%. A rabdomiólise é o principal efeito adverso, especialmente quando se utiliza uma combinação de gemfibrozil com estatinas. Os principais representantes da classe incluem Fenofibrato (48-145 mg/dia) e Gemfibrozil (600 mg duas vezes ao dia).

Niacina

Reduz os níveis de triglicerídios em 30-50%, e reduz o LDL em 5-25% e o HDL em 20-30%. Posologia: 0,5 a 2,0 gramas duas a três vezes ao dia (comprimidos de liberação imediata) ou 250-750 mg uma ou duas vezes ao dia (comprimidos de liberação lenta). Principais efeitos adversos incluem vermelhidão facial, descompensação glicêmica e aumento dos níveis de enzimas hepáticas.

Óleo de Peixe

Reduz os níveis de triglicerídios em 30-50%, porém aumenta os níveis de colesterol total (LDL e HDL) em 5-10%. Posologia: comprimidos contendo ésteres de ácido Omega-3 (1 a 2 gramas por dia). Dispepsia e sintomas gastrintestinais irritativos são os principais efeitos colaterais.

Abordagem do paciente

Ao se deparar com um paciente com Hipertrigliceridemia, a primeira medida deve ser um aconselhamento sobre mudanças nos hábitos de vida. O papel da perda ponderal, da dieta equilibrada (pobre em açúcar e rica em fibras), da prática regular de exercícios e da interrupção do tabagismo jamais deve ser menosprezado.

Todos os pacientes devem ser avaliados quanto à presença de comorbidades. Por exemplo: se o paciente for portador de diabetes, as medidas para controle dos níveis glicêmicos poderá resultar em correção da hipertrigliceridemia sem necessidade de medicamentos hipolipemiantes adicionais.

Em pacientes hipertensos, a redução da morbiletalidade cardiovascular dependerá também da correção dos níveis tensionais.

Em todos os casos, a farmacoterapia deve ser individualizada ao máximo.

Conclusão

Apesar da abordagem terapêutica da dislipidemia mista ainda ser motivo de grandes controvérsias, o tratamento deve ser direcionado principalmente para a redução dos níveis de colesterol LDL. Se os níveis de triglicerídios também estiverem altos, sua redução também ajudará a manter os níveis de LDL dentro dos limites desejáveis. Pacientes com hipertrigliceridemia severa devem ser tratados de modo mais urgente devido ao risco de pancreatite aguda. Além da deita (e outras mudanças nos hábitos de vida), os principais recursos farmacoterápicos incluem estatinas, fibratos, niacina e óleo de peixe, tomados isoladamente ou em associação.

Referências Bibliográficas

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Copyright © 2008 Bibliomed, Inc. 20 de maio de 2008

sábado, 10 de maio de 2008

Tratamento ortopédico da Classe III em padrões faciais distintos

Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial

Print ISSN 1415-5419

Rev. Dent. Press Ortodon. Ortop. Facial vol.10 no.5 Maringá Sept./Oct. 2005

doi: 10.1590/S1415-54192005000500008

ARTIGO INÉDITO

Tratamento ortopédico da Classe III em padrões faciais distintos

Orthopedical treatment of Class III in different facial patterns

Paula Vanessa Pedron OltramariI; Daniela Gamba GaribII; Ana Cláudia de Castro Ferreira ContiIII; José Fernando Castanha HenriquesIV; Marcos Roberto de FreitasIV

IMestre e Doutoranda em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru - USP
IIMestre e Doutora em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru - USP; Professora Associada da Disciplina de Ortodontia da Universidade Cidade de São Paulo - UNICID; Coordenadora do curso de especialização em Ortodontia da Prevodonto Centro de Estudos - Rio de Janeiro
IIIMestre e Doutora em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru - USP; Professora da disciplina de Ortodontia da Universidade Paulista - UNIP, Campus Bauru
IVProfessores Titulares do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru - USP

Endereço para correspondência


RESUMO

A má oclusão de Classe III, de origem essencialmente esquelética, produz uma acentuada deformidade facial. A Classe III pode ser interceptada durante a fase de crescimento e desenvolvimento craniofacial mediante o uso de aparelhos ortopédicos. O crescimento mandibular, predominantemente endocondral na cartilagem condilar, obedece essencialmente ao controle genético. Portanto, os efeitos dos aparelhos ortopédicos que visam restringir o crescimento da mandíbula mostram-se limitados, o que conduz ao pobre prognóstico de tratamento precoce da Classe III determinada pelo prognatismo mandibular. Felizmente, o componente esquelético maxilar responde melhor à aplicação de forças ortopédicas, já que o crescimento ósseo intramembranoso mostra-se mais susceptível a influências extrínsecas ou ambientais. Deste modo, a Classe III morfologicamente definida pelo retrognatismo maxilar, privilegia-se com o tratamento ortopédico. Este trabalho discute o tratamento interceptivo da Classe III por meio da tração reversa da maxila em pacientes com padrões faciais distintos, apresentando dois casos clínicos, e ainda ressalta os aspectos atinentes a sua estabilidade.

Palavras-chave: Máscara facial. Expansão rápida da maxila. Prognatismo esquelético. Classe III.


ABSTRACT

The Class III malocclusion, essentially of skeletal origin, produces an accentuated facial deformity. These malocclusion can be intercepted during the growth phase and craniofacial development by the use of orthopedical appliances. The mandibular growth, predominantly endocondral at the condilar cartilage, follows a genetic control essentially. Therefore, the effect of orthopedical appliances that aim restriction in the jaw's growth are shown limited, what leads to a poor prognostic of precocious treatment of the Class III determined by a mandibular prognathism. Fortunately, the skeletal maxillary component answers better to the application of orthopedical forces, since the growth of intramembranous bone is shown more susceptible to extrinsic influences. This way, the Class III morphologically defined by the maxillary retrognatism is privileged with the orthopedical treatment. This work discuss the interceptive treatment of Class III through the maxillary protraction in patients with different facial patterns, through the presentation of two clinical cases, and still focuss on the concerning aspects of its stability.

Key words: Facemask therapy. Rapid maxillary expansion. Skeletal prognatism. Mesiocclusion.


INTRODUÇÃO

O tratamento precoce da má oclusão de Classe III tem mostrado efetividade do ponto de vista esquelético23,30, em especial quando essa má oclusão possui um componente de retrognatismo maxilar ou uma combinação de retrognatismo maxilar e pequeno prognatismo mandibular, o que representa grande parte dos pacientes com esta deformidade3,14. Isto porque, uma vez que as suturas maxilares formam-se, pela ossificação intramembranosa, são mais susceptíveis a influências ambientais quando comparadas à mandíbula, que possui crescimento essencialmente endocondral e, portanto, mais propenso a determinações genéticas4. Desta forma, a Ortopedia pode atuar mais facilmente sobre o crescimento da maxila, interceptando precocemente a Classe III definida pelo retrognatismo maxilar.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O DIAGNÓSTICO

O diagnóstico ideal da má oclusão de Classe III deve ser precoce, se possível ainda na dentadura decídua. Quanto mais cedo, a interceptação suscita maiores efeitos ortopédicos em detrimento dos inevitáveis efeitos ortodônticos11. Além disso, devolver a estética à criança precocemente implica contribuir para sua auto-estima, levando-se em consideração o fator psicológico18.

A má oclusão de Classe III agrava-se ao longo do crescimento, principalmente a partir da adolescência. Deste modo, na criança, esta má oclusão não se apresenta totalmente definida, e as características faciais e oclusais ainda sutis podem dificultar o diagnóstico. A identificação precoce desta discrepância esquelética depende da observação minuciosa de uma série de características faciais, oclusais, e cefalométricas que revelam forte tendência à Classe III. A ausência da proeminência zigomática ou malar constitui o sinal facial que traduz o retrognatismo maxilar (Fig. 1.2, 2.2). A linha mento-pescoço aumentada em relação à profundidade da face média e o ângulo mais agudo entre mento e pescoço denunciam a contribuição da mandíbula na Classe III (caso 2).

As características oclusais da Classe III nas dentaduras decídua e mista parecem bastante variáveis. No caso 1, a paciente apresenta-se no primeiro período transitório da dentadura mista, com mordida cruzada total. No caso 2, a mordida cruzada total apresenta-se associada à mordida aberta devido ao hábito persistente de sucção (Fig. 2.3). Mesmo diante da relação canino de Classe I, podemos classificar a má oclusão como Classe III, baseando-se sobretudo no padrão facial, na relação interarcos e secundariamente nas características cefalométricas.

A observação radiográfica constitui um complemento para a análise clínica. Na radiografia panorâmica, verifica-se a presença de todos os germes dos dentes permanentes não irrompidos e a ausência de distúrbios de irrupção ou patologias. A telerradiografia em norma lateral deve ser avaliada morfologicamente. Os números cefalométricos devem ser considerados com certa cautela, porque pacientes Classe III freqüentemente apresentam a base do crânio encurtada. Com o ponto "N" localizado mais posteriormente, obtém-se leituras errôneas das medidas cefalométricas que utilizam a base do crânio como referência (SNA, Nperp-A, SNB, Nperp-P). A conduta mais coerente para estes pacientes é a utilização de medidas que comparam o comprimento efetivo da maxila (Co-A) e da mandíbula (Co-Gn) com os valores dados no Atlas de Crescimento Craniofacial15. No caso 2, os valores iniciais para as medidas Co-A (78mm) e Co-Gn (98mm), quando comparados às medidas de normalidade para a idade Co-A (81,5mm) e Co-Gn (99,3mm), demonstram a maior participação da maxila que da mandíbula na composição da Classe III. A altura facial ântero-inferior aumentada (60mm, quando se esperava 58mm, segundo a tabela de McNamara), juntamente com a inclinação do plano mandibular aumentado indicam, ainda, um predomínio de crescimento vertical neste paciente. A identificação do prognatismo mandibular e do padrão vertical de crescimento empobrecem o prognóstico de tratamento precoce, devido a menores chances de estabilidade pós-tratamento. No caso 1, as medidas iniciais para Co-A (75mm) e Co-Gn (98mm) mostram também a maior participação da maxila na determinação da Classe III, já que o Atlas de Crescimento mostra valores de normalidade de 78,9mm para a maxila e 95,5mm para a mandíbula na idade de 6 anos. Porém, o padrão de crescimento horizontal (SN.GoGn: 33º e AFAI: 62mm) contribui na definição de um bom prognóstico de tratamento ortopédico.

O tratamento precoce da má oclusão de Classe III direciona-se para a maxila, por meio da expansão rápida da maxila (ERM) seguida pela protração maxilar2,6,8,9,11,12,23. A ERM, além de corrigir a mordida cruzada posterior, estimula a atividade celular das suturas, potencializando os resultados da protração13,19,27,28,29,30. A ERM pode ser realizada utilizando-se o aparelho expansor tipo Haas20,21,24; com ganchos laterais soldados por vestibular para receber os elásticos de protração (Fig. 1.8, 1.9, 2.8, 2.9). A ativação do parafuso obedece ao protocolo de Haas7, extendendo-se aproximadamente por duas semanas. Quando se observa a abertura do diastema interincisivos, por volta do 4º dia de expansão, instala-se a máscara facial para tração reversa da maxila. Nota-se que a protração maxilar inicia-se ainda durante a fase ativa da ERM1. O paciente é orientado a utilizá-la 14 horas/dia, excluindo o período escolar. Há no mercado uma grande variabilidade de aparelhos extrabucais de protração maxilar. No caso 1 optou-se pela máscara facial de Turley, em que é necessária a moldagem facial (Fig. 1.13, 1.14); já no caso 2, optou-se pela máscara pré-fabricada de Petit (Fig. 2.14, 2.15).

Alcançada a sobrecorreção do trespasse horizontal, a máscara é utilizada como contenção, somente para dormir, pois já se alcançou a sobrecorreção do trespasse horizontal. No caso 2, o aparelho expansor foi substituído por uma barra palatina fixa com grade, para facilitar a higienização e correção da mordida aberta anterior (Fig. 2.22, 2.23, 2.24, 2.25). O estabelecimento do trespasse vertical adequado, antes da remoção da máscara, apresenta grande importância para a estabilidade do tratamento (Fig. 2.16).

Após o uso da máscara de tração reversa da maxila, verificou-se o deslocamento anterior da maxila, atestado pelo aumento do SNA, NperpA, e a rotação da mandíbula no sentido horário, comprovado pelo aumento do SN.GoGn e redução do SNB, que conjuntamente contribuíram para o aumento da convexidade facial (ANB e NAP) e para a melhora dos contornos faciais. (Fig. 1.19, 2.19).

No caso 2 após a suspensão da máscara facial, diante do componente de prognatismo mandibular, prolongou-se a contenção ortopédica por mais um ano, com o uso noturno da mentoneira (Fig. 2.26).

DISCUSSÃO

Uma vez diagnosticada a Classe III, deve-se considerar a possibilidade de interceptação precoce. Isso possibilita um bom relacionamento oclusal, facial e psico-social, favorecendo o crescimento e desenvolvimento normal da criança.

A correção da Classe III esquelética, por meio da expansão rápida aliada à tração reversa da maxila, resulta de uma combinação de mudanças esqueléticas e dentárias que produzem a melhora significante do perfil facial. No entanto, esta opção cabe somente à Classe III com envolvimento maxilar em sua configuração morfológica. Apesar do diagnóstico e tratamento corretos, parece difícil prever a estabilidade dessa terapia, uma vez que dependerá do padrão de crescimento do paciente pós-tratamento10. Contudo, pode-se realizar um prognóstico positivo ou negativo baseando-se nas características morfológicas iniciais, isto é, considerando-se o componente maxilar ou mandibular que compõe a Classe III, juntamente com o padrão de crescimento facial. No caso 1, a análise facial denunciava uma significante deficiência maxilar com a mandíbula muito aceitável, e a paciente apresenta um padrão de crescimento horizontal, que permitia as alterações verticais compensatórias, inerentes ao tratamento ortopédico. Uma vez que é mais fácil o tratamento e a obtenção da estabilidade sobre o crescimento da maxila, esta paciente apresenta um prognóstico bastante favorável. Portanto, possivelmente apresentará a manutenção dos resultados do tratamento precoce ao longo do desenvolvimento subseqüente. Já no caso 2, o paciente apresenta um padrão de crescimento vertical, e apesar da retrognatismo maxilar, a mandíbula apresenta-se com uma marcante participação na Classe III, segundo a análise facial. Desta forma, neste jovem há maiores expectativas de recidiva e deve-se considerar a possibilidade de um tratamento orto-cirúrgico ao término do seu crescimento.

Uma vez que o crescimento pós-tratamento não pode ser previamente determinado, torna-se imprescindível a sobrecorreção do trespasse horizontal e a manutenção da contenção por período adequado. Isto deve ser esclarecido aos pais e ao paciente desde o início, para que eles estejam devidamente informados e convidados a cooperar com o tratamento.

CONCLUSÃO

Ao realizarmos o tratamento precoce da Classe III esquelética, devemos ser realistas. Os resultados poderão perpetuar-se ou a estabilidade será ameaçada com o retorno do padrão de crescimento original. Todos os antídotos contra a recidiva devem ser utilizados: a sobrecorreção do trespasse horizontal, o estabelecimento de um trespasse vertical adequado para o travamento da relação sagital entre os arcos dentários, e a contenção ortopédica por período prolongado. Ainda, faltaria à Ortodontia o controle da genética humana. Portanto, é importantíssima a conscientização dos pais e pacientes desde o início do tratamento, mantendo-os sempre como nossos cúmplices nessa "tentativa" de tratamento precoce.

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Endereço para correspondência
Paula Vanessa Pedron Oltramari
Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva
Faculdade de Odontologia de Bauru - USP.
Alameda Dr. Octávio Pinheiro Brisolla, 9-75.
CEP: 17.043-101 - Bauru/SP - Brasil
E-mail: pvpo@usp.br

Enviado em: Outubro de 2003
Revisado e aceito: Agosto de 2005

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terça-feira, 6 de maio de 2008

SÍNDROMES ASPIRATIVAS (SAsp)

Neste Artigo:

- Introdução
- Exame do paciente
- Exames complementares
- Tratamento
- Conclusão
- Referências Bibliográficas

As Síndromes Aspirativas (SAsp) incluem todas as situações onde substâncias estranhas são inaladas pelos pulmões. Em geral, estas síndromes decorrem da presença de conteúdos orais ou gástricos associados a refluxo gastresofágico, disfunções da deglutição, distúrbios neurológicos e/ou anormalidades estruturais. Pacientes que sofrem de SAsp apresentam um risco significativo para seqüelas respiratórias graves e até mesmo morte. Um evento de aspiração maciça possui um índice de mortalidade de 25%.

Introdução

Não existem dados estatísticos bastante específicos sobre a incidência das Síndromes Aspirativas (SAsp), uma vez que o distúrbio apenas reflete a freqüência da doença subjacente.

As principais causas de SAsp incluem Refluxo Gastresofágico (RGE), disfunções da deglutição, distúrbios neurológicos e alterações anatômicas. Até 80% das crianças com asma apresentam RGE, e cerca de 40-50% daquelas com RGE desenvolvem sintomas respiratórios aspirativos. Cerca de 70% dos pacientes com disfagia faríngea apresentam aspiração silenciosa.

Exame do paciente

As 4 situações clínicas mais freqüentemente associadas a SAsp incluem sibilos recorrentes, apnéia, tosse crônica e pneumonia recorrente.

Os sibilos podem estar relacionados à aspiração de conteúdo gástrico. O risco de aspiração deve ser considerado em todo pacientes com sintomas asmáticos refratários ao tratamento habitual; sintomas respiratórios noturnos ou inexplicáveis; ou dificuldade em associar os sintomas à exposição a alérgenos ambientais, IVAS ou exercícios.

Pneumonias recorrentes comumente são observadas em crianças com problemas neurológicos. Episódios de apnéia (tanto obstrutiva quanto central) podem estar associados à aspiração em crianças muito novas. A microaspiração indireta do refluxo causa inflamação laríngea, rouquidão e tosse. A bem da verdade, a tosse crônica, definida como tosse com mais de 3 semanas de duração, pode ser a única manifestação da aspiração recorrente.

A presença de sintomas respiratórios em certos cenários clínicos também deve levantar a possibilidade de SAsp, como, por exemplo, crianças com abscessos pulmonares, fibrose cística, bronquiectasias, bronquite crônica, bronquiolite obliterante, doença pulmonar obstrutiva crônica ou até mesmo soluços persistentes.

Ao exame físico, a SAsp pode apresentar-se com febre, taquipnéia, sibilos, estertores crepitantes, tosse, congestão das vias aéreas superiores, baqueteamento digital (no caso de pneumopatias crônicas), batimento de aletas nasais, tiragens intercostais, cianose, rouquidão, irritabilidade, erosões dentais e sinais de hipoxemia.

Exames complementares

A avaliação complementar inicial deve incluir: hemograma completo, gasometria arterial, análise do suor, espirometria e níveis séricos de IgM, IgG, IgA e IgE.

A radiografia simples do tórax pode revelar hiperinsuflação, infiltrados peri-hilares ou intersticiais uni ou bilaterais, derrame pleural, consolidações lobares ou segmentares, e/ou bronquiectasias.

A avaliação do trato gastrintestinal superior com contrastes ou endoscopia é essencial para avaliar a presença de hérnia de hiato, má-rotação, estenoses, e esofagite eosinofílica.

A pH-metria de 24 é um teste bastante sensível para detectar RGE.

Outros exames que devem ser considerados na vigência de SAsp incluem laringoscopia e broncoscopia flexível com lavado bronquioalveolar.

Tratamento

A abordagem conservadora deve ser a conduta inicial. A criança deve ser posicionada o mais de pé possível durante a alimentação. Bebês com menos de 6 meses não devem ser colocados sentados por pelo menos 90 minutos após a alimentação. O mesmo intervalo de tempo deve ser observado entre a última refeição e a hora de dormir. A elevação da cabeceira em 30º pode ajudar.

As principais modificações dietoterápicas incluem uso de engrossantes, aumento da freqüência com redução do volume das refeições (10-20 mL/Kg/refeição). Outras medidas terapêuticas podem ser associadas de acordo com o distúrbio de base.

Durante um episódio agudo de SAsp, a conduta consiste em liberação das vias aéreas e – em alguns casos – antibioticoterapia (cefalosporinas de segunda ou terceira geração são os agentes mais indicados). Havendo necessidade, o paciente deve ser intubado para proteger as vias aéreas. A observação em nível hospitalar pode ser necessária nas primeiras 48h.

Os dados concernentes ao emprego de corticóides no tratamento das SAsp são limitados. Vários estudos clínicos não foram capazes de demonstrar benefícios significativos no uso de corticóides durante eventos aspirativos agudos. Com base nestes dados, a corticoterapia sistêmica não deve administrada de forma rotineira.

Procedimentos cirúrgicos, como fundoplicatura de Nissen, gastrostomia, jejunostomia, traqueostomia e outros, podem ser indicados conforme a necessidade.

Conclusão

De um modo geral, as síndromes aspirativas (SAsp) possuem um prognóstico favorável, mas a evolução do paciente no longo prazo dependerá grandemente do distúrbio de base. O refluxo gastroesofágico, uma das principais causas de SAsp, costuma se resolver espontaneamente por volta dos 12-24 meses de idade.

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