quarta-feira, 30 de abril de 2008

Diabetes e gravidez

Neste Artigo:

- Introdução
- Morbidade fetal durante a gestação
- Morbidade perinatal e tocotraumatismos
- Diagnosticando o diabetes
- Controle do diabetes
- Conclusão
- Referências Bibliográficas

As alterações nos níveis de glicose afetam 3-10% de todas as gestações. Os bebês de mães diabéticas possuem o dobro do risco de complicações sérias durante o parto, uma possibilidade três vezes maior de parto cesareano, é uma incidência quatro vezes maior de admissão em UTI neonatal.

Introdução

A cada refeição, a gestante passa por uma seqüência complexa de alterações hormonais, incluindo hiperglicemia e secreção pancreática secundária de insulina, glucagon, somatomedinas e catecolaminas adrenais. Estes ajustes permitem que uma boa – porém não excessiva - quantidade de glicose seja disponibilizada para a mãe e o feto.

Compara a mulheres não-gestantes, as grávidas possuem uma maior propensão para desenvolver hipoglicemia (glicemia média de 65-75 mg/dL) entre as refeições e durante o sono. Isto ocorre porque o feto continua retirando glicose da corrente sangüínea materna através da placenta mesmo durante os períodos de jejum.

Os níveis de esteróides e hormônios peptídeos (p.ex.: estrógenos, progesterona, somatomamotrofina coriônica) elevam-se de modo linear ao longo dos segundo e terceiro trimestres. Uma vez que estes hormônios aumentam a resistência insulínica, a produção de insulina tende a aumentar no decorrer da gestação. No último trimestre da gravidez, os níveis médios de insulina encontram-se 50% acima daqueles observados em mulheres não-gestantes.

Se a resposta pancreática maternal não for adequada, desenvolve-se um estado de hiperglicemia materno-fetal. Esta alteração em geral se manifesta como episódios recorrentes de hiperglicemia pós-prandial.

Acompanhando o estado de hiperglicemia, o feto passa a apresentar episódios de hiperinsulinemia. O armazenamento excessivo de nutrientes resulta por sua vez em macrossomia fetal. O gasto energético associado à conversão do excesso de glicose em gordura também causa redução dos níveis de oxigênio no feto.

A hipoxemia fetal faz-se acompanhar de picos de catecolaminas adrenais, que, por sua vez, causam hipertensão, remodelamento e hipertrofia cardíaca, estimulação da eritropoetina, hiperplasia eritrocitária e elevação do hematócrito. A policitemia (hematócrito >65%) está presente em 5-10% dos bebês nascidos de mães diabéticas, e pode resultar em alterações circulatórias e maior incidência de hiperbilirrubinemia pós-natal.

Morbidade fetal durante a gestação

O diabetes melito dobra o risco de aborto. Pacientes com níveis de glicohemoglobina acima de 11% apresentam um índice de aborto espontâneo de 44%.

Más-formações congênitas afetam 1-2% da população geral. Em mulheres com diabetes melito descompensado, este índice aumenta 4 a 8 vezes. A maioria das alterações envolve os sistemas nervoso central e cardiovascular.

Apesar da maioria dos bebês de mães diabéticas apresentarem aceleração do crescimento, muitos deles apresentam alterações no padrão de desenvolvimento. A macrossomia fetal (definida como peso ao nascer acima do percentil 90 para a idade gestacional ou maior que 4 Kg) ocorre em 15-45% das gestantes diabéticas. Estes bebês apresentam um risco significativamente maior de complicações durante o parto, incluindo distócia do ombro e trauma do plexo braquial.

O excesso de reservas lipídicas freqüentemente se estende pela infância, chegando a alcançar a idade adulta. Por volta dos 10-16 anos de idade, cerca de 20% destas crianças apresentarão alterações no metabolismo da glicose.

Morbidade perinatal e tocotraumatismos

Apesar da mortalidade fetal relacionada ao diabetes materno ter diminuído 30 vezes desde a descoberta da insulina em 1922, os índices atuais de mortalidade perinatal ainda são aproximadamente duas vezes maiores que aqueles observados em mulheres não-diabéticas. Má-formações congênitas, síndrome da angústia respiratória aguda e prematuridade extrema respondem pela maioria dos casos de óbito perinatal em gestantes diabéticas.

A distócia de ombro ocorre em 0,3 a 0,5% dos partos normais em mulheres não-diabéticas. Este índice é duas a quatro vezes maior em mulheres com diabetes, mas pode ser reduzido com o controle adequado dos níveis glicêmicos durante a gravidez.

A hiperinsulinemia fetal aumenta o risco de hipoglicemia ao nascimento, especialmente quando a mãe não foi capaz de manter um bom controle dos níveis glicemicos ao longo da gestação. Se não reconhcida a tempo, a hipoglicemia pós-natal pode resultar em convulsões, coma e danos cerebrais.

Metade dos bebês de mães diabéticas apresenta redução dos níveis séricos de cálcio (<>

O feto não-diabético atinge a maturidade fetal por volta da 34-35ª semana gestacional. Por volta da 37ª semana, mais de 99% dos bebês apresentam pulmões maduros segundo a avaliação por fosfolipídios. Contudo, em gestantes diabéticas, o risco de complicações respiratórias graves relacionadas à imaturidade pulmonar se estende até por volta da 38,5ª semana gestacional.

Diagnosticando o diabetes

Pacientes com diabetes melito tipo 1 em geral são diagnosticadas durante um episódios de hiperglicemia, cetose e desidratação. Isto costuma ocorrer durante a infância ou adolescência, bem antes da primeira gravidez. Apenas em raros casos o primodiagnóstico de diabetes melito tipo 1 ocorre durante a gestação.

Por outro lado, o diagnóstico de diabetes melito tipo 2 é mais difícil de ser feito durante a gravidez, pois as formas mais severas de diabetes gestacional (DG) apresentam manifestações clínicas semelhantes. Apesar de níveis de glicohemoglobina de 8% no primeiro trimestre serem altamente sugestivos de diabetes tipo 2, o diagnóstico definitivo de diabetes tipo 2 deve ser feito após o término da gestação, através o teste de tolerância à glicose.

O DG só ocorre durante a gravidez. Os principais fatores de risco incluem idade materna avançada, obesidade, antecedente de macrossomia fetal e história familial fortemente positiva para diabetes, entre outros. O diagnóstico de DG é feito com o teste de tolerância à glicose.

Gravidez e Diabetes Melito: rotina complementar recomendada

Primeiro

Trimestre

  • Rotina habitual do pré-natal, incluindo ultra-sonografia.
  • Glicohemoglobina.
  • Uréia e creatinina.
  • T4 e TSH.
  • Dosagem de proteína e creatinina na urina de 24h.
  • Glicemia capilar pelo menos 4 vezes ao dia.
  • Avaliação oftalmológica materna.

Segundo

Trimestre

  • Ultra-sonografia morfológica por volta da 18-20ª semana de gestação.
  • Ecocardiograma fetal caso os níveis de glicohemoglobina se mantenham elevados ao longo do primeiro trimestre.
  • Repetir dosagem de proteína e creatinina na urina de 24h nas mulheres com aumento dos níveis de creatinina ou clearence de creatinina <>
  • Repetir Glicohemoglobina.
  • Glicemia capilar pelo menos 4 vezes ao dia.
  • Nas pacientes com suspeita de pré-eclâmpsia: repetir dosagem sangüínea de uréia, creatinina, painel de função hepática, ácido úrico, hemograma completo e Doppler do cordão umbilical.

Terceiro Trimestre

  • Ultra-sonografia morfológica por volta da 26-36ª semana gestacional.
  • Amniocentese para avaliar o grau de maturidade pulmonar fetal caso o parto esteja sendo programado para antes da 39ª semana gestacional.

Controle do diabetes

Para evitar as complicações materno-fetais relacionadas ao diabetes, um bom controle é essencial. As metas atuais incluem as seguintes recomendações: glicemia de jejum inferior a 105 mg/dl, glicemia pós-prandial <155>

A insulinoterapia deve ser conduzida de modo a evitar eventos hipoglicêmicos entre as refeições ou à noite. A glicemia deve ser mantida entre 70 e 120 mg/dL.

Mulheres diabéticas devem fazer uso de suplementos vitamínicos diários contendo pelo menos 1 mg de ácido fólico, de preferência por 3 meses antes da concepção, para minimizar o risco de defeitos do tubo neural no feto.

O objetivo da dietoterapia é evitar refeições muito volumosas ou com grande concentração de carboidratos simples. Recomenda-se um total de 6 refeições por dia, com 3 refeições principais intercaladas por 3 pequenos lanches. Os carboidratos devem responder apenas 35-40% da dieta.

Conclusão

A gestante diabética possui particularidades que devem ser conhecidas e acompanhadas para reduzir o risco de complicações materno-fetais. No presente artigo, são apresentadas e discutidas as principais situações deste cenário, além das recomendações gerais para contorná-las.

Referências Bibliográficas

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Copyright © 2008 Bibliomed, Inc. 29 de abril de 2008

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